Ainda tem sentido e significado prático relembrarmos mais um treze de maio e outras datas que dizem respeito diretamente à questão do povo negro e do racismo no Brasil? Em que patamar o Dia da Abolição da Escravatura, Dia da África ou Dia Nacional da Denúncia contra o Racismo, datas estas todas referendadas neste mês de maio, embasam ou são indicadores de alguma mudança na realidade do mundo do trabalho para a comunidade negra, ou em relação à violência contra a mulher e a juventude negras, à intolerância religiosa, ao não cumprimento da Lei 10.639/03 que trata da inserção, nos currículos escolares, do ensino da história da África e afro-brasileira, à legitimação das terras quilombolas? A Tradição, quase que comemorativa, que se mantém ao relembrarmos tais datas reflete, de fato, alguma intencionalidade para a mudança no status étnico em nosso país? Relembrar para quê? Relembrar para manter ou para mudar? 125 anos após a abolição da escravatura e ainda estamos presos a mesquinhos e interesseiros preconceitos. Mesquinhos porque revelam o que em nós, humanos, tem muito mais a ver com limitação, incompetência no entendimento do outro enquanto todo outro; com o assentimento dele em sua lógica cultural, sua expressão de ser, sua relação com o próximo, com a natureza e com o transcendente. Interesseiros, pois, desde a sua gênese até nossos dias, a criação ideológica denominada Racismo serviu, sim, a grupos econômicos que, ora abençoados por algumas igrejas e religiões, ora por algumas doutrinas sociais e partidos políticos, e, por vezes, até pela instituição escola e pela Ciência financiaram, para a manutenção do seu poder, concepção de mundo selada a partir da convicção sobre a hierarquia entre as etnias, apresentando-a como Natural, inerente ao humano. Algumas constatações veiculadas pelos meios de comunicação dão conta de que: “…segundo o IBGE, pretos e pardos têm rendimento escolar inferior, menos anos de estudo, piores condições de vida e estão mais sujeitos à violência do que a população de pele clara”. E aprofunda relatando, literalmente, “…conforme síntese dos indicadores sociais de 2012: enquanto um caucasiano recebe 3,5 salários mínimos mensais, uma simples mudança no tom da pele derruba esse rendimento para 2,2 salários, no Estado do Rio Grande do Sul por exemplo, o que representa uma diferença de 59%”. E ainda – “No mesmo estado, no indicador Violência, há 39,4 vezes maior risco do negro ser assassinado / A Taxa de homicídios por mil habitantes é: Brancos: 19 e Negros: 25,1 / No campo da Educação: brancos estudam oito anos e nove meses em média e Negros estudam sete anos e meio / Referente ao Analfabetismo (maiores de 5 anos não alfabetizados) – Brancos: 7,9 e Negros: 14,8 / Condições de Vida: em Favelas 5,1% brancos e 12,7% de negros”. (Censo IBGE, Mapa da Violência 2012). O Racismo institucionalizou-se e, via lutas populares, mas, também pela institucionalidade (Cotas Raciais, implementação de Leis, ação afirmativa por exemplo) ele deve ser combatido. Aliando estes dados anteriores à pergunta inicial“Libertar o quê ou quem? De que, de quem?”, percebo que todos, negros e não negros, ainda, carecemos desta tão ambicionada liberdade. A Lei Áurea, sonhada e idealizada por muitos, ainda não surtiu o efeito devido. Os negros, nos Quilombos, já bem antes de 1888, sabiam que só com uma mudança nas estruturas e, consequentemente, na forma de ver o mundo de cada um, cada uma é que se poderia vislumbrar verdadeira liberdade para todos – povos da África, indígenas e homens/mulheres colonizadores. O modo de vida de muitos negros e negras, em nossos dias, ainda relembra a escravidão. Todos perdemos com isso. Todos acabamos por sermos escravizados à realidade do mundo do consumo e do Mercado. Enquanto houver Haitianos, chegados ao nosso país e sendo tratados por alguns como epidemia; enquanto houver grupos de extermínio que fazem verdadeira limpeza étnica em muitas favelas de nosso país; enquanto a especulação imobiliária for um dos motivos relevantes para o “apaziguamento”, a custa de mortes de inocentes em Morros onde muitos negros e negras residem; enquanto não se propuserem políticas de saúde massivas e específicas para a população negra; enquanto líderes quilombolas e indígenas continuarem a ser ameaçados e assassinados por defender a legitimação de terras herdadas; enquanto não for retratado nos meios de comunicação (novelas, programas de humor, ancoragem de telejornais) a verdadeira “cara” do Brasil que é, em mais de 50% escura; enquanto as crianças, negras e não negras, não aprenderem na escola sobre a cultura africana e afro-brasileira; enquanto essa forma, negra, de existir não for apresentada nos livros didáticos; enquanto as religiões Afro não forem respeitadas enquanto códigos doutrinais eivados de conhecimento e sabedoria; enquanto o Brasil não perceber a Filosofia negra imbuída de poeira, barro e pensamento; enquanto nossa língua não se acostumar a desligar Negro de Escravo; enquanto não percebermos que há jeitos étnicos diferentes de sermos seres humanos; enquanto não nos flagrarmos que, já há muito tempo, Negro não é sinônimo de minoria em nosso país…a Liberdade não terá chegado aos lares de negros e não negros de nossa amada e idolatrada terra Brasil. Neste contexto, ainda existe sentido prático em relembrarmos o treze de maio, pois a utopia ainda não se materializou. “O racismo não decorreu da invenção das raças; ele a precedeu”. Para combatê-lo, necessitaremos entender e compreender a multiplicidade e pluralidade que a Raça Humana, que é uma só, possui. Cito Agostinho Neto, poeta africano, em seu poemaNegação: “…quero que o não-eu / se aposse de mim Mais do que um simples suicídio / Quero que esta minha morte Ele, no poema, optou desaparecer. Nós almejamos que o negro torne-se cada vez mais VISÍVEL, mais negro; que o índio torne-se cada vez mais índio, o branco, o asiático e todas a multicores etnias tornem-se cada vez mais visíveis e apareçam para o mundo e para a mentes. Secretário de Comunicação, Publicidade e Mídia da NSB Pedro Francisco da Silva Filho
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Autor: Pedro Francisco da Silva Filho
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