“O Homem nasce livre, e por toda a parte encontra-se a ferros (…) Quando um povo é obrigado a obedecer e o faz, age acertadamente; assim que pode sacudir esse jugo e o faz, age melhor ainda” (Jean-Jacques Rousseau) A história dos povos africanos e afrodescendentes no cenário da humanidade é uma história de luta por reconhecimento, de superação do preconceito, de afirmação dos valores e segredos que acompanham o jeito de viver e ser do povo negro, de conquistas e de posicionamento diante da sociedade civil. Os europeus, quando da era industrial, conceberam os povos africanos como potenciais consumidores dos seus produtos industrializados e arquitetaram naquele continente a exploração das terras, dizimaram etnias e, consequentemente a cultura local. Os europeus traçaram uma estratégia de destruição da cultura nativa, e, de maneira sutil implantaram a cultura europeia e capitalista em terras africanas, após a imposição cultural e capitalista, os povos africanos foram vítimas de uma das mais terríveis e cruéis formas de desrespeito que possa existir entre os seres humanos – a escravidão. Em nome do sistema escravocrata, os povos europeus ceifaram muitas vidas de negros e negras, ainda na África, quando eram forçados e forçadas a se juntarem no porto das Lamentações para em seguida serem amontoados no interior de navios (equivocadamente denominados de navios negreiros) e outras tantas mortes durante a viagem entre África e Brasil e demais continentes onde fora admitido a escravidão. Quando das atrocidades desencadeadas pelos europeus e britânicos em terras africanas, aqui no Brasil as terras eram tomadas pelos portugueses como fontes de exploração econômica (ouro, pau-brasil, cana-de-açúcar e etc.), e em nome do lucro e da avareza, os portugueses não só implantaram o sistema escravocrata, como imputaram aos nossos ancestrais africanos e africanas, uma das mais sangrentas formas de destruição da vida humana, uma vez que negros e negras eram sumariamente açoitados por não se submeterem à escravidão. Uma vez dentro dos navios, seus destinos estavam terrivelmente traçados a vir trabalharem gratuitamente para os “ricos” portugueses e mais tarde, para os brasileiros. Aqui viveram mais de dois séculos (aproximadamente 256 anos) em condições sub-humanas, sem alimentação digna, sem salário, sem lar, sem pátria e sem identidade. A princípio, toda a riqueza econômica e, consequentemente, a riqueza cultural e arquitetônica desse país, repousa sobre o sangue e o suor derramados de um povo bravio e destemidos – os nossos ancestrais africanos. Semelhante ao Brasil, do meio dos canaviais em outros continentes, os negros e negras se revelavam verdadeiros heróis e heroínas e em defesa da liberdade e da dignidade humana, lutaram até à morte. Dentre esses heróis e heroínas três deles nós negros e negras de todos os tempos e lugares não podemos ignorar jamais as suas memórias: Martin Luther King Jr. (EUA), Nelson Mandela (África do Sul) e Abdias do Nascimento (Brasil). De Luther King, cito: “A injustiça em algum lugar é uma ameaça à justiça em todos os lugares”. Razão pela qual esse guerreiro americano lutou bravamente pelo fim da segregação racial em seu país. Desse verdadeiro pastor da Igreja Batista, legamos a bravura, a determinação, o respeito ao diferente e a responsabilidade pelos seus atos. Luther King, jamais temeu ao seu adversário, jamais o desrespeitou, soube no momento certo colocar em cheque a Lei oficial, porém, injusta daquele país. O pastor entendia que uma lei é injusta quando essa está em desarmonia com a lei moral e, por isso, não podia ser respeitada. Luther King, afirmava que a lei injusta é um código que um grupo numericamente majoritário ou detentor de algum poder impõe sobre um grupo minoritário ou menos poderoso. Isso é a legalização da diferença afirmava. Acrescentava: a lei justa é um código que a maioria impõe sobre a minoria e o qual se dispõe a acatar. Isso é a legalização da igualdade. Os valores e os exemplos desses três heróis defensores do fim de todo e qualquer tipo de escravidão ou de segregação racial, transcendeu as fronteiras de sues respectivos países e chegou aos povos da América latina, oportunizando-os a tomar consciência de nossa real história e levantar o olhar e enxergar novos horizontes e dias promissores. A história real e vivida pelo povo negro nos diversos continentes, tem sido a história da negação de direitos morais, sociais, políticos e religiosos. Razão pela qual em 2004, em Cayambe-Equador, realizou-se o 1º Encontro Continental de Teologias y Filosofias Afro, Indígena y Cristiana, cujo objetivo era discutir o processo de negação histórica que resultou na marginalização do povo negro no Brasil e nos países latino americanos. É fato que os negros e negras latino-americanos estão se organizando e têm-se intensificado diversas ações em prol da causa negra, ainda que tímidas, mas nos permite afirmar que há uma nova mentalidade surgindo nesse sentido. Recentemente, foram produzidos vários documentários tratando da realidade do povo negro na América latina, intitulado: “A América também têm Cor”. Nesses documentários percebe-se que em nenhum dos países da América Latina, o povo negro vive em condições de igualdade com os brancos. Por essa razão, são discutidos e debatidos nos respectivos documentários problemas de diversas ordens, quais sejam: dificuldades de ingresso e permanência na escola, violência urbana, dificuldades de acesso ao trabalho, ingresso em universidades entre outros. Diante desse contexto, os grupos organizados avançam e a cada ano vencem obstáculos, participando e discutindo a realidade dos povos afrodescendentes. A consciência e o enfrentamento político organizado é nesse caso, o viés de ação e participação para alcançar os resultados almejados pelos povos afrodescendentes. Isso implica em afirmar que mesmo atravessando uma madrugada escura, o povo negro na América Latina, e em específico, no Brasil, tem consciência de que uma iluminada manhã está chegando e então, vislumbrar-se-á um novo dia e uma nova realidade. No Brasil, a realidade do povo afrodescendente não é diferente da realidade dos demais países da América Latina, embora haja aqueles que por má fé, ingenuidade e ou pobreza de espírito humanamente falando, tende a disseminar a “pseudoverdade” de que entre nós brasileiros não existe discriminação etnicorracial. Lamentavelmente veiculam essas falsas afirmações em revistas de alcance nacional. A exemplo cito uma matéria publicada pela revista Época de 04 de abril de 2009, cujo título era: “Cotas para quê?”. Na referida matéria, o geógrafo Demétrio afirma não haver racismo na sociedade brasileira. Esses pensadores sociais infelizmente prestam um desserviço à sociedade quando se trata de discutir a questão do povo negro nesse país. Segundo estatísticas do Instituto Brasileiro Geográfico e Estatístico (IBGE), cerca de 73% da população brasileira afirmou ser negra ou parda. Esse dado nos dá respaldo e fundamentos para não só exigir os direitos básicos ao ser humano, mas exigir que leis, ações afirmativas e políticas públicas sejam aplicadas e respeitadas pelo poder público e privado nesse país. Como são os casos das leis 10.639/2003 e o Estatuto da Promoção da Igualdade Racial de 2010. Diante de tal contexto, nós negros e negros da NSB, chamamos a atenção de absolutamente todos os empoderados/as do Partido Socialista Brasileiro – PSB (parlamentares, vereadores/as, governos de Estado e etc.) para a necessidade de defender, incentivar o debate, mas, sobretudo, repensar a concepção de “Reforma Urbana”, pois, o que denominamos de reforma urbana, corre-se o risco de perpetuar uma das possíveis “patologias sociais” que atinge a maior parte da população negra, a saber – a discriminação ambiental. Geralmente, a polução com baixos níveis de conhecimento e econômico, têm como habitat os “bairros pobres” ou as favelas. Nesses setores, há a carência de saneamento básico, de uma estrutura hospitalar adequadas, escolas com logísticas adaptadas às exigências do ensino-aprendizagem, segurança pública qualificada, transporte público de qualidade e etc. Consequentemente, a população que vive num meio ambiente com essas descrições, certamente tende a serem vítimas da violência urbana, pois o processo de favelização é de certa forma alimentada pelo poder público, uma vez que os investimentos públicos são na maioria das vezes desviados para outros setores da sociedade. Por outro lado, as famílias oriundas das favelas, são intencionalmente educadas para assimilar a ideia de que a estrutura social, a estética urbana, a distribuição igualitária das políticas públicas e a vida digna em sociedade, é um direito de poucos. Fato é que se um povo recebe do poder público um estudo precário, certamente não terá condições de se posicionarem, de reivindicarem politicamente e, semelhante comportamento culmina em ações violentas de cunho pessoal (justiça pelas próprias mãos). Nas regiões discriminadas e denominadas de “favelas ou bairros pobres”, reside em maior número a população negra e são as vítimas diretas da ação criminosa de muitos policiais e de outros jovens brancos. É visível a pobreza estética do ponto de vista arquitetônico e urbanísticas da localidade onde destinada aos pobres. As cores das casas não expressam vida, altivez, falta-lhe um projeto de jardinagem decente, material de qualidade duvidosa, projetos das plantas nem sempre são adequados às condições de vida dos moradores e etc. São itens importantes e não podem ser ignorados pelo poder público, pois a casa é identidade do indivíduo, é um direito natural. Todo indivíduo vem ao mundo e com ele vem o direito de ter um teto para se abrigar… Talvez por essa razão, toda criança e adultos quando lhes pede um desenho espontâneo, a casa sempre lembrada como primordial. Estamos convencidos de que um partido político que na sua estrutura não pensa nos seus concidadãos e concidadãs, um partido político não pode ser, mas uma associação com finalidades personalizadas. Um partido político descente, que prima pela prática ética, vai categoricamente defender o seu povo no sentido amplo do termo, conscientemente lutar e envidar esforços conjunto para ver a política livre da corrupção e da enganação, em fim, um partido verdadeiramente político quer pelas suas ações gerar resultados em benefício desse povo. Seguindo esse raciocínio, mantem-se atual e pertinente à pergunta: a quem interessa a tentativa de impossibilitar as políticas afirmativas e reparatórias em relação ao povo negro brasileiro? Quais serão os grupos que continuarão beneficiados diretamente com esta malfadada ação? Por outro lado, sabemos que a ideia de “libertação dos escravos” foi sem dúvidas uma prática insana do ponto de vista político, social e étnico. Vários fatos por si só explicam o porquê que a ideia de “libertação da escravidão” foi insana. Primeiro todos os povos negros presentes em terras brasileiras, vieram à força e, aqui submetidos ao trabalho escravo, nesse caso, eram expatriados, de forma que não houve libertação, nem podia haver, pois, não nasceram e jamais foram escravos em sua pátria. Segundo, depois de 356 anos de trabalho escravo, a partir de 13 de maio de 1888, negros e negros no Brasil não eram mais obrigados a trabalharem sob o regime de escravidão. Em conformidade com o novo sistema econômico implantado no país, deveriam ser indenizados financeiramente, mas não foram. Nesse caso, com a tal “lei áurea” os sem pátria, sem lar, sem terra, sem indenização, sem comida, sem família, foram terrivelmente forçado à miséria social e, dada a nova realidade político-econômica, submetidos e submetidas ao subemprego para poder sobreviver. A usura, o desejo insano de alguns homens pelo poder político e econômico, tornou a nossa pátria, uma nação que atualmente esconde em baixo dos tapetes dos palácios uma das mais cruéis discriminações aos povos negros, tamanha é a sua sutileza e dissimulação que só as mentes mais acuradas as percebem. Reafirmamos o nosso compromisso em estabelecer o diálogo de forma articulada com Direção Nacional, Estadual e Municipal do PSB, demonstrando à sociedade os reais avanços já alcançados por meio de ações e programas de governo. Além disso, nos dedicaremos em tempo integral ao trabalho de contribuir por meio de políticas públicas que garantam as conquistas alcançadas e abram caminho para os passos seguintes. Diante do exposto e indubitavelmente: 1 – A Secretaria Nacional da Negritude Socialista (SNNSB) é com essa denominação legalmente constituída reafirma o compromisso assumido no III Congresso Nacional do Movimento Negro do PSB – 2008, e também no I Encontro Nacional da Negritude Socialista Brasileira do PSB – 2010 em Pernambuco que articulada com a base aliada do governo federal, visa promover e apoiar campanhas de candidaturas negras em todo país. 2 – Defendemos que a Direção Nacional do PSB, conscientiza os parlamentares da importância da prática da defesa dos programas dos segmentos sócias do partido; 3 – Que envide esforços para colocar e defender na prática as exigências contidas no Plano Nacional da Negritude Socialista, quando do I Encontro da Negritude Socialista em Pernambuco. 4 – Comprometimento dos parlamentares do PSB com as causas defendidas pelos segmentos sociais que compõem a estrutura do partido; 5 – Que a direção nacional do PSB cobre e envide esforços para eliminar mediante leis e projetos o racismo na sociedade brasileira; 6 – Defendemos, igualmente, a superação do Coordenador Nacional da NSB e voltamos á existência do primeiro secretário da NSB e criando-se á secretária executiva da NSB e mantendo-se a secretária geral com suas respectivas e atuais funções. A baixa destes mantém-se todos os demais existentes da melhor maneira organizacional e formatacional possível; 7 – Defendemos a criação de uma comissão mínima de 03(três) pessoas do diretório nacional da NSB, cujo objetivo é acompanhar e cobrar ações que desrespeito ás políticas públicas, ações afirmativas e fomento á cultura. 8- Defendemos a Participação de 03(três) membros do diretório da NSB, na condição de personalidades, na composição na composição do futuro Diretório Nacional do PSB, por terem ao longo de mais de 10 (dez) anos envidado surpreendentes esforços para á criação do segmento no partido; 9 – Defendemos Cotas Eleitorais para o afro descendente, partindo-se do percentual de 20%, de acordo com a tese da NSB em 2008 no III Congresso Nacional da Negritude Socialista Brasileira; 10 – Defendemos á participação de membros dos segmentos organizados no partido em seus órgãos direcionais, em conformidade com a lei, nas Seccionais da Fundação João Mangabeira, conforme preceitua a legislação pertinente, aos Estados; e, por fim; 11 – Defendemos o estabelecimento de uma Resolução da próxima CEN, que determine um percentual a partir de 10%, relativo ao fundo partidário, como forma de viabilizar os trabalhos dos segmentos, a ser praticado e administrado pelas instâncias nacionais dos segmentos e do partido. Conclusão Em suma temos que propor uma nova educação ao povo brasileiro, a qual deve fundamentar-se no respeito e no reconhecimento ao diferente. Do contrário, corre-se o risco de não vermos novos tempos, conforme almejava o já citado no texto Abdias Nascimento: … Esperemos todos que as escuras nuvens do preconceito etnicorracial passem logo e que a densa névoa da incompreensão se dissipe de nossas comunidades encharcadas de medo, e que num amanhã não muito distante as estrelas radiantes do amor e da fraternidade brilhem sobre nossa grande nação com toda sua beleza.
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Autor: Profº. Mcs. Domingos Barbosa dos Santos
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