Ivanilda Matias
O Estado Democrático se funde nos princípios da igualdade, da pluralidade, da legalidade e da participação. Embora o Estado Democrático se fundamental nesses princípios, não garante, no plano das políticas públicas, o acesso universal aos direitos econômicos, sociais e culturais. Tal isonomia, em cada contexto social, é o resultado de lutas efetivas. A luta pela cidadania democrática consiste num processo de luta pela redução e disparidade entre os direitos conquistados no plano formal e a cidadania efetiva para todos os segmentos sociais. No âmbito da legalidade, o Estado Democrático de Direito funda-se no respeito à lei acima dos privilégios de classes e na constituição de leis que ampliem os direitos à igualdade. Uma das condições do Estado Democrático de Direito, é, pois, ampliar a conquista de mecanismos de proteção dos direitos, para que sejam respeitados, protegidos, monitorados e para inserirem nas políticas públicas ações de inclusão e redução das desigualdades. Segundo Carone, ( 2004, p.7) (…) um dos mecanismos de correção das desigualdades seria o de implantar a ‘igualdade de condições’ para os segmentos excluídos (mulheres, minorias étnicas, deficientes físicos, populações carentes, etc.) da hierarquia ocupacional e dos poderes institucionalizados.
Associar a concepção de Estado Democrático com o tema da monografia significa fundamentar os princípios teóricos deste modelo de Estado com as políticas públicas, para analisar como o Estado Brasileiro trata a Educação Superior e nesta, a Assistência Estudantil. Inserido, no Ensino Superior, vários segmentos sociais demandam proteção do Estado, como forma de garantir a inclusão educacional. Abordar tal questão implica refletir as dificuldades que brasileiros e brasileiras com baixo poder aquisitivo têm enfrentado para fazerem valer seus direitos à educação, pois os estudiosos da temática, hão de convir que não é uma tarefa fácil para um cidadão comum a efetivação ao acesso aos direitos sociais escritos na lei. Há uma enorme diferença entre o que está determinado teoricamente e a prática ou efetivação de direitos. A busca incessante para ter acesso aos benefícios sociais que constam como direitos, é, muitas vezes, uma história de frustrações e conflitos. Se os estudantes e gestores da educação não têm essa consciência do quanto é árduo construir um Estado para muitos, poderão muitas vezes, agir em direção contrária, tamanho são os conflitos e as dificuldades. A fragilidade de uma cultura democrática é um dos grandes desafios na implementação das políticas públicas. A cultura clientelista ainda se apresenta em contraposição à cultura republicana e democrática. Muitos setores da sociedade e do poder público, ainda veem o ensino superior e a assistência estudantil como concessão e não como direito ou como forma de inclusão social. Não é difícil encontrarem-se operadores do sistema público, que justificam tal ação como concessão, como favor, negando os direitos de cidadania. No bojo da efetivação das políticas públicas há um cenário político importante. Dependendo de como os atores se comportam nessa correlação de forças é possível averiguar ou não como se conquistam os direitos sociais. Esse enfrentamento necessário para a consolidação de um direito ou para o surgimento de um novo, segundo SANTOS, (1997, p.2)
(…) começa a surgir campo para um “Direito Social”, o qual tem suas bases fundamentais nos aspectos sociais da Nação, tendo como diretrizes a proteção efetiva dos direitos primordiais do ser humano como: a vida, a dignidade, a integridade física, a consciência, a liberdade etc.
Na implementação de políticas sociais inclusivas é possível observarem-se resistências por parte daqueles segmentos que se encontram em condições de inclusão, o que revela como o fenômeno da exclusão é um processo social e cultural. O que fundamenta os valores republicanos e democráticos é justamente o inverso. É o acesso compartilhado, o respeito ao que é público, a efetivação e o respeito às leis, o combate aos privilégios e o acesso amplo de todos aos bens públicos. A mentalidade fundada numa concepção de exclusão posiciona-se contrária ao acesso a muitos direitos a igualdade. Essa mentalidade é a mesma que resiste a políticas sociais universalistas e às políticas de ação afirmativas. A educação enquanto direito social é fruto de muitas lutas pela democratização do acesso à escolarização e a educação pública e de qualidade. Se a democracia é resultado de uma construção coletiva, ela requer persistência para que realmente os direitos sociais sejam conquistados e concebidos como direito de todos e não concedidos como benesses. Segundo Martinez,(2002, p. 3).
Ao direito de alcance propriamente social, global, geral, de relevância social, mas que também seja um direito composto de significados, exercício e usufruto social, como direito público e subjetivo que tenha de ser assegurado pelo Estado, a exemplo da educação e saúde.
Para alguns teóricos, os direitos sociais devem ser tratados como direitos fundamentais, ou seja, iguais aos direitos trabalhistas, e que estejam sob a proteção institucional que os defendam, como ressalta Martinez, “do assédio privatista”. Para Bobbio, (1992, p.25).
Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é a sua natureza e seu fundamento, e são direitos naturais ou históricos, absolutos ourelativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados.
Quando se coloca em debate ou em estudo o ensino público como “direito de todos e dever do Estado”, há confrontos com grandes barreiras e se constata o quanto é árdua a luta dos trabalhadores para ultrapassarem o clientelismo e garantirem escola e ensino de qualidade para seus filhos. Os relatórios que tratam do direito à educação demonstram como o acesso e a permanência, ainda, são desafios a enfrentar e ultrapassar para que de fato e de direito à educação seja um direito protegido e efetivado para muitos e não para alguns segmentos sociais. O direto social se gesta a partir da luta de um grupo social na busca por melhores condições de vida, grupo esse consciente de seus direitos e vigilante da necessidade de acompanhar a efetivação da ação do Estado e seus dirigentes. Segundo Asensi, “o direito social enfatiza a igualdade material dos homens, portanto, o Estado deve tratar os homens desiguais desigualmente, de modo a torná-los iguais materialmente”.(ASENSI, 2005, p.5). Para que o direito à educação esteja ao alcance de todos e que todos os benefícios dela decorrentes sejam amplamente acessíveis, é necessário que se tenha uma ampla compreensão da educação como um direito e não como privilégio ou como “uma esmola”. Não se trata de qualquer educação, qualquer escolarização, trata-se de ensino de qualidade que de fato contribua para que todos os segmentos sociais possam se desenvolver em todos os níveis. Oferecer condições diferenciadas para se conseguir alcançar maior patamar de igualdade, muitas vezes não é compreendido pelos segmentos incluídos. Ao contrário, o tratamento desigual aos segmentos historicamente tratados com desigualdade é visto com receio e resistências. Todos admitem que ocorrem graves desigualdades, os dados não deixam esconder mais, entretanto, poucos admitem haver uma maior atenção, por parte do Estado para que se reduzam as desigualdades históricas, seja no âmbito da educação ou do trabalho. A crise do emprego e do trabalho aumenta as rivalidades entre segmentos incluídos e excluídos, como se alguns pudessem ficar à margem para que poucos garantam sua inclusão. A exclusão se caracteriza, justamente, pela negação do outro como sujeito de direitos. A desigualdade incorporou-se aos nossos costumes e nossa alma produzindo a cultura de exclusão, que é contrária à visão de solidariedade, de dignidade e de igualdade. Enquanto as diferenças são construtivas, pois é o que nos diferencia uns dos outros, a desigualdade nos inferioriza, gerando discriminação e ódio entre segmentos, grupos e povos (Comparato, Op.Cit. p.19). A artimanha da classe privilegiada é justamente formar mentalidades excludentes, que não deixem ampliar a cultura dos direitos humanos entre os segmentos sociais e entre os povos. Ardilosas, as elites não só procuram historicamente garantir mecanismos políticos e ideológicos de dominação e de sustentação de seus privilégios. Martinez (Op. Cit. p., 03 )ao tratar dos direitos sociais refere-se,
(…) à dimensão globalizada, integrada (não excludente, não refratária ou meramente dogmática, excessivamente formal ou sectária do direito), buscando-se a máxima realização da isonomia e da proporcionalidade.
Neste caso, o autor vem ratificar o que se defende, ou seja, se o direito, não pode ser equiparado a um favor. Para efetivação do mesmo, tem-se, antes de tudo, de se criarem mecanismos de acessibilidade que garantam a equidade de todos, seja na educação, na saúde, na cultura, no lazer, na habitação ou na criação de novas políticas sociais. O direito à educação no plano internacional está prescrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1946), na Declaração de Viena (1993), na Conferência Mundial sobre Educação para Todos (1990), no Pacto dos Direitos Econômicos e Sociais (1996) e na Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância em Durban (2002). O direito à educação está reconhecido e protegido na Constituição de 1988, na LDB de 1996 e no Plano Nacional de Educação de 2001. AConstituição Federal no Art. 212º prevê a destinação de não menos do que dezoito por cento, no caso da União, e de não menos que vinte e cinco por cento, no caso dos Estados, de sua receita proveniente de impostos, incluindo também as provenientes de transferências, para a manutenção e desenvolvimento do ensino. (Constituição Federal do Brasil, 1988, p. 137). A Constituição Federal de 1988 define a educação como direito “de todos e dever do Estado e da Família”, que tem como objetivo, o pleno desenvolvimento da personalidade, da cidadania e a qualificação para o trabalho. São princípios da Constituição Brasileira, em vigor, a igualdade de condições; o acesso e a permanência à liberdade, o pluralismo de ideias, a coexistência entre público e privado, a gratuidade do ensino público, a gestão democrática da política pública. São deveres do Estado Brasileiro, o ensino fundamental obrigatório e gratuito, a acessibilidade e a progressiva universalização do ensino médio, o atendimento especial as pessoas com deficiências, o ensino noturno, entre outros. A educação no contexto do Estado de Direito Democrático é a base constitutiva do desenvolvimento humano e da cidadania, é um bem público. A equidade em relação à educação significa enfrentarem-se as desigualdades no tocante à faixa etária, ao gênero, a etnia e raça, aos grupos vulneráveis, as regiões e as classes sociais, garantindo oportunidades iguais e ao mesmo tempo respeitando as diferenças sociais. O capítulo III da LDB, que trata da Educação Profissional não dissocia essa dimensão da educação com da política de trabalho e do desenvolvimento científico e tecnológico. |
Autor: Ivanilda Matias
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